Por Mariana Abuchain*
Em 2020, o Brasil aprovou o registro de 493 agrotóxicos, o maior número já documentado pelo Ministério da Agricultura desde 2000, quando a pasta começou a compilar esses dados. Agravando mais essa situação, o “Projeto de Lei dos Venenos” (PL 6299/2002) licenciado em 2022 na Câmara dos Deputados, torna o registro e uso do veneno mais fácil, beneficiando o agronegócio, principal responsável pelo alto uso de agrotóxicos.
Segundo Viviane Brochardt, doutora e pesquisadora em Direito à Informação sobre Agrotóxicos, existem efeitos crônicos que ocorrem frente ao consumo constante de pequenas doses de agrotóxicos. Nos alimentos, por exemplo, vários tipos de câncer são associados a isso, o que pode prejudicar o desenvolvimento físico e intelectual de crianças, resultar em problemas respiratórios, de memória, levar ao aborto e à impotência.
A pesquisadora comenta que a produção de alimentos com agrotóxicos tem levado à contaminação dos solos e das águas. “Em recente levantamento feito pela Agência Pública de Jornalismo, foi identificado na água que chega nas nossas casas em várias cidades do país, mais de 27 tipos de agrotóxicos diferentes”, relata.
Brochardt enfatiza o fato de que os agrotóxicos têm esse nome porque de fato são produtos tóxicos e que a ideia do “Projeto de Lei dos Venenos” é alterar o nome de agrotóxicos para produtos fitossanitários. Uma forma de maquiar o que, de fato, significam os agrotóxicos.
A doutora alerta que vários agrotóxicos utilizados no Brasil não são permitidos, por exemplo, na União Europeia, onde há várias sedes de grandes empresas produtoras. Contudo, pelo fato da legislação ser mais criteriosa e pela impossibilidade de utilizá-los no seu país de origem, as ações europeias exportam para os países em desenvolvimento, como o Brasil, que tem um controle mais permissivo pelos órgãos públicos.
“É importante fortalecer a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), como órgão regulador, e que legisla os agrotóxicos no país, no que diz respeito à saúde humana, quanto mais fortalecido o órgão for neste sentido, menos pressão ele sofre das empresas”, ressalta Brochardt.
Ela complementa dizendo que o acesso à informação confiável é uma das ferramentas que a sociedade têm. “É extremamente importante essa participação social, a sociedade tem de se colocar contra ou a favor das decisões do governo”, afirma.
Frente a tantas consequências advindas do uso dos agrotóxicos, a possibilidade ainda de se comer alimentos orgânicos e de qualidade pagando preços mais acessíveis parece difícil, mas em Brasília é possível encontrar alguns exemplos de feiras permanentes e itinerantes que nos ajudam a resistir a essas políticas impostas. São mais de 64 feiras espalhadas pelo Plano Piloto, Taguatinga, Ceilândia, Guará, Brazlândia que, segundo o Sindicato dos Feirantes (Sindifeira), garantem o sustento de cerca de 20 mil trabalhadores.
Uma das iniciativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) foi a Feira da Ponta Norte, que acontece desde 2019 em todos os sábados das 8h às 14h, oferecendo alimentos produzidos de forma agroecológica e sustentável.
Mais de 20 bancas compostas por pequenos produtores rurais, povos de comunidades tradicionais e assentados da reforma agrária – e que segundo o MST corresponde a 70% da produção dos alimentos destinada à mesa das famílias brasileiras – se reúnem para oferecer uma alimentação mais saudável para a comunidade, a interação entre campo e cidade e a ocupação dos espaços públicos.
*Extensionista de Comunicação Comunitária